Partiu


Eu acho muito estranho quando acordo com um texto bem estruturado na mente, algo que creio ser muito digno de ser compartilhado, mas simples e repentinamente o texto se vai. O texto, de certa forma, ainda está lá, seus pontos principais, a ligação, o assunto. Mas parece que falta algo. A ideia vai ficando distante. É como se o dia e as preocupações com os afazeres tomassem o lugar de nossos próprios pensamentos. O  mundo ao redor vai ditando como devo ocupar minha mente.

Hoje bem cedo, antes de deixar meu quarto, a palavra do meu dia foi sobre um verso da Bíblia que diz: "Finalmente, irmãos, tudo o que for verdadeiro, tudo o que for nobre, tudo o que for correto, tudo o que for puro, tudo o que for amável, tudo o que for de boa fama, se houver algo de excelente ou digno de louvor, seja isso o que ocupe os vossos pensamentos." (Filipenses 4.8). 

Quando comecei a escrever este texto, o assunto era outro. Estava pensando em alguns amigos que tiveram os seus corações partidos há pouco tempo. A imagem que estampa o texto está ali em cima como prova disso. Mas, pouco a pouco, o texto foi se desfazendo. E agora começo a concluir que é muito fácil esquecer dos outros quando vamos nos ocupando com pensamentos que se referem única e exclusivamente a nós mesmos. 

Longe de mim afirmar que não devemos dar atenção às nossas prioridades e necessidades. Mas será que devemos ocupar todo o nosso dia com o olhar voltado apenas para nossa própria existência? Será que não há mais espaço na nossa vida para pensar em mais alguém?

Logo cedo, eu pensei. Pensei nos meus amigos que tiveram os seus corações partidos. É verdade, que penso em muita gente, até mesmo nos motoristas (principalmente nos motociclistas) que me acompanham diariamente no meu caminho pela BR. Como será o dia deles? Procuro ser gentil na direção, embora seja difícil negar que os instintos de competição não estão só ao meu redor, mas também dentro de mim. Mas mesmo assim, penso que um gesto de cortesia pode garantir um ótimo dia para alguém. Uma pequena oração que faço, quando olho pelo retrovisor, pode manter a salvo o motociclista que se arrisca insanamente entre os carros e ultrapassa veloz do meu lado.

Mas, nesta hora, meus amigos voltam a ocupar meus pensamentos. O que dói, de fato, não é a negativa de alguém. Porque receber um "não" faz parte da vida. O que machuca mesmo é o desdém pelos sentimentos de quem está ali ouvindo aquelas duras palavras. Ele se colocou ali porque ama e isto deveria valer alguma coisa. Encontrar alguém que se arrisque por amor, hoje em dia, é algo cada vez mais raro. E vejo mais e mais reportagens que falam sobre os que escolheram não namorar porque podem se ferir. Bem, mas esse ainda não é o ponto que eu quero falar.

Eu quero falar para aqueles que ainda sonham. Que possuem um desejo imenso de convidar alguém para dançar uma valsa, porque isso é belo a despeito do que pensam. Falo para aqueles que são românticos apesar disso parecer uma realidade distante. Talvez vocês não esteja vendo, mas há aquelas ao seu redor que gostam de jantares a luz de vela. Que desejam uma boa companhia, uma boa conversa, mesmo quando elas são ríspidas e brigonas. Mesmo que elas não chorem ao ver "A menina que roubava livros" - talvez quem estava chorando era você! (Risos)

É, é bem possível que esta pessoa esteja aí bem perto, esperando que vocês sejam carinhosos com ela, mesmo sobe tamanha aparência de dureza. Porque, talvez, toda essa dureza seja para esconder um coração mole e amável. Pois ela tem tanto medo quanto vocês de se ferir. E se vocês forem sensíveis ao ponto de notar e buscar ter essa companhia, serão mais felizes do que imaginam. Não porque encontraram alguém que te corresponda o carinho, mas porque conseguiram fazer alguém ser livre para lhes confiarem quem realmente é.

Pare. Olhe. Escute.



Ao pensar um pouco sobre ideias incompletas, me sinto na obrigação de escrever um novo poste que fale um pouco mais sobre mim. E bem diferente dos textos que costumo escrever, estes últimos não possuem uma introdução, um corpo de texto no qual desenvolvo a ideia para no fim trazer algum desfecho que traga uma revelação ou uma identificação do texto. São textos mais livres, assim como é a alma, cheia de meios e recomeços, raramente satisfeita com algo que possa ser chamado de fim. Alma inquieta que deseja dar o próximo passo, que deseja avançar num caminho mesmo sabendo que está a depender do tempo, da oportunidade certa.

Em certos momentos, estamos tão envolvidos com as emoções que borbulham dentro de nosso peito. E também olhamos para as situações ao nosso redor. Sentimos que nossa razão está exigindo de nós uma atitude, pois se não a tomarmos logo, outra pessoa tomará em nosso lugar e talvez o que tanto buscamos acabará na mão de outro alguém. Poxa, este pensamento é desesperador! Agir ou não agir? São tantas vozes em nosso consciente que nos sentimos perdidos, qual delas ouvir?

Mas ainda há uma voz, muito mais sutil e que sempre está a nos dizer de forma serena que atitude devemos seguir, seja de esperar, avançar ou até mesmo recuar. A questão é que nem sempre estamos atentos a ouvi-la. É como se estivéssemos em um show de rock, no qual as nossas emoções são a banda a tocar no último volume, as pessoas ao nosso redor gritassem freneticamente e nossa doce e gentil companhia estivesse procurando falar ao nosso ouvido palavras de amor e orientação. Como escutá-la no meio de tamanha pressão??? 

Uma coisa eu aprendi no meu tempo devocional: é necessário parar! Pare! Nosso instinto é de mover-se, sentir que estamos saindo do lugar, ver algo acontecer! Mas não é possível dar plena atenção a algo ou alguém enquanto estamos sendo embalados pela vibração do momento, não é verdade? Então pare! Não queira se mover quando você não sabe para onde dar um passo. E quando você parar, comece a olhar ao seu redor, procure ver se você está na melhor posição para ouvir. Mesmo parado, isso não quer dizer que estamos prontos para ouvir. Às vezes nossos olhos estão voltados para o lugar errado, para a pessoa errada. Nossos ouvidos ainda estão voltados para o som frenético das emoções. É preciso fazer o que instintivamente fazemos em situações como estas: baixamos nossas cabeças, evitamos olhar ao redor e nos concentramos em escutar o que nossa companhia está falando.

Três passos simples: parar, olhar e escutar. E embora eu ame fazer isso, nem sempre estou dedicando a disciplina necessária para desenvolver esta prática. Um dos lugares em que mais gosto de estar e ter meu tempo a sós (com Deus) é na praia, olhando para o mar. Lembrando-me que existe alguém muito maior que o meu ego, que é maior que minhas angústias, que tem todo tempo do mundo. Mesmo enquanto eu me inquietava com minha pressa, com a sensação que o meu tempo está passando e as oportunidades se esvaindo. Mas quando não posso ir ao meu lugar favorito, a quietude de um quarto já é um ótimo lugar. 

Mas o show tem que ficar de fora desde momento. Tem que ser um momento de entrega, de abrir mão. Um querido amigo meu, Angus Hunter, me ensinou que a real entrega é quando você abre as mãos com as palmas voltadas para baixo. Depois, que você entrega, não há mais como fechar a mão e segurar novamente. E isso é muito forte, vai contra o nosso instinto de controle. É claro, que quanto mais conhecemos o que e quem nós somos, percebemos que o nosso controle da vida é ilusório, é somente um placebo que tomamos para nos sentirmos senhores de alguma coisa. Um alimento para o nosso ego.

O problema é que quanto mais tomamos desse "remédio", mas longe ficamos deste três passos simples, que podem trazer paz para o nosso dia a dia. Preferimos a doce ilusão de controle, do que simplesmente reconhecermos que não podemos seguir, que não temos o controle. Portanto, pare, olhe e escute.